Você costuma falar com o seu filho com “voz de bebê”?

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Por Naíma Saleh – atualizada em 19/02/2015 12h10
Fonte: Revista Crescer

É quase involuntário alterar a forma de falar na hora de se dirigir a um bebê. As vogais ficam mais alongadas, a entonação melodiosa e os fonemas são pronunciados articuladamente, ao mesmo tempo em que as expressões faciais traduzem o discurso. A sobrancelha se franze com ênfase na hora de dar uma bronca, a voz se torna doce e melosa na hora de fazer um carinho e mais forte a animada ao dar um parabéns. “Quem é o nenéeeem qui comeu tu-diiiii-nhoooo?”

No entanto, uma pesquisa realizada pelo IKEN Brain Science Institute (BSI), no Japão, em parceria com o Laboratoire de Sciences Cognitives et Psycholinguistique, de Paris, na França, mostrou que esse tipo de fala nem sempre é o mais claro para o bebê. Especialistas analisaram o discurso de 22 mães japonesas em duas circunstâncias diferentes: quando elas conversavam com outro adulto e quando elas se comunicavam com seus filhos.

A partir das gravações dos discursos dessas mulheres, foi possível comparar o grau de similaridade acústica entre sílabas parecidas como ‘ta’ e ‘da’ ou ‘po’ e ‘bo’. Analisando os 118 contrastes entre as sílabas mais frequentes, os pesquisadores concluíram que a mensagem ficava um pouco menos clara quando era dirigida à criança, ou seja, quando era mais infantilizada, do que no diálogo com um adulto.

Para o fonoaudiólogo Jaime Zorzy, do Conselho Federal de Fonoaudiologia, o resultado da pesquisa não deve deixar os pais preocupados: alterar a fala para se dirigir à criança não prejudica o desenvolvimento dela, desde que sejam observados certos limites. “Só não dá para usar sempre uma voz infantilizada, diminuir o tamanho das palavras ou imitar a fala da criança fazendo disso um padrão de comunicação”, explica.

Para os pesquisadores, a descoberta é importante “porque desafia a visão difundida de que os pais devem superarticular (as palavras)”, explica a cientista francesa Alejandrina Cristia, envolvida no estudo. Uma das hipóteses levantadas pelos especialistas é a de que a maneira como as mães alteram a linguagem ao se dirigir aos bebês tem um objetivo simples: o de tentar transmitir não só a mensagem em si, mas um sentimento junto da fala.

Uma questão de opinião

Pesquisas anteriores já haviam revelado resultados contrários, afirmando que essa fala mais cheia de firulas seria, sim, benéfica ao desenvolvimento dos bebês. Para Zorzy, resultados contraditórios podem refletir culturas distintas que, por sua vez, mudam a maneira como são estabelecidas as interações dos pais com os bebês. “Há uma influência cultural muito grande, inclusive sobre o tipo de relação entre filhos e pais, o que afeta a linguagem”, explica. Independente da cultura, as conclusões paradoxais entre diferentes estudos mostram que essa questão de usar ou não uma maneira modificada de falar com as crianças é divergente até mesmo entre os especialistas. “Acredito que a fala infantilizada não contribua para a evolução da linguagem”, afirma a fonoaudióloga Camila Gomiero, do Colégio Humboldt (SP). Para ela, os pais devem se atentar aos fatores que realmente contribuem para o desenvolvimento da criança e da linguagem oral, como o afeto, o acolhimento, a entonação, o hábito de contar histórias e o contato físico.

Uma voz mais melodiosa desperta na criança muito mais interesse do que uma voz seca e monótona, por exemplo. Nesse sentido, os pais podem, sim, usar de diversos artifícios para conquistar a atenção. Afinal, as expressões faciais e os gestos também fazem parte do processo de comunicação. O principal é que, optando ou não por falar com seu filho de um modo mais maternal, alguns conselhos servem para todos:

– Sempre fale olhando para a criança, de preferência na mesma altura dela, para que ela possa enxergar direito o seu rosto e ter também um modelo visual para a comunicação.

– Não use palavras erradas, como “bololeta” no lugar de “borboleta”, só porque é bonitinho falar errado. Mesmo que seu filho não pronuncie a palavra corretamente, cabe a você dar o exemplo: “Ah, você está falando da borboleta, filho?”

– Não corrija demais. Reforce o modelo correto de forma positiva, sem dizer que o modo como ele falou está errado. Isso pode fazer a criança se sentir desencorajada a falar e prejudicar o desenvolvimento da linguagem.

– Ao fazer uma pergunta, tenha paciência e dê um tempo para a criança se organizar e preparar uma resposta.

– Ajude a criança a verbalizar o que ela quer e incentive o jogo vocálico, em vez de usar apenas a comunicação “olho no olho”.

– Estimule-o sempre a ir cada vez mais longe. Se o seu filho já sabe usar uma palavra, ensine outra. Assim, ele começa a ampliar seu vocabulário.

– Sempre chame as palavras pelo nome específico: em vez de falar “isso é uma fruta”, ensine “banana”, “maçã”, “mamão”. Uma pesquisa da Universidade de Massachusetts, nos Estados Unidos, revelou que, quando os pais ensinam às crianças o nome certo dos objetos elas aprendem a reconhecer melhor as diferenças entre as coisas e desenvolvem uma atividade cerebral mais parecida com a de um adulto. Portanto, quando for ensinar uma nova palavra a seu filho, seja bem específico!